quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

O Plano de Deus, a Autoridade de Deus e a Igreja

I - Deus quer exercer sua autoridade por meio do homem:

Somos os muitos filhos de Deus, o que resultará, por fim, em sermos conduzidos por Deus à glória. A redenção não mudou o propósito de Deus; pelo contrário, ela cumpriu o propósito que não foi cumprido na criação. O propósito original de Deus era que o homem tivesse domínio especificamente na terra, mas o homem lamentavelmente caiu. No entanto, todas as coisas não findaram por causa da queda do homem. o que Deus não obteve do primeiro homem, Adão, Ele obterá do segundo homem, Cristo. Porque Deus ordenou que o homem reinasse e restaurasse a terra, e determinou que a criatura humana destruiria Satanás, houve o memorável nascimento em Belém. Eis porque o Senhor Jesus veio tornar-se homem. Vemos que o primeiro homem não cumpriu o propósito de Deus, mas pecou e caiu. Ele não apenas falhou em restaurar a terra, mas ele mesmo foi capturado por Satanás. Ele não somente falhou em reinar, mas ele próprio foi subjugado pelo poder de Satanás. O homem não mais poderia lidar com Satanás; ele estava acabado. Que então poderia ser feito? Será que Deus nunca mais poderia alcançar Seu propósito eterno, não mais poderia obter o que desejava? Acaso Deus nunca poderia restaurar a terra? Não! Ele enviou Seu Filho para tornar-se homem. O Senhor Jesus é verdadeiramente Deus, mas também é verdadeiramente homem. 
Em todo o mundo há finalmente um homem que escolhe Deus, uma pessoa que pode dizer: "O príncipe do mundo (...) nada tem em Mim". Em outras palavras, no Senhor Jesus não há sequer vestígio do príncipe deste mundo. Devemos perceber atentamente que o Senhor veio ao mundo não para ser Deus, mas para ser homem. O que Deus precisava era um homem. Se o próprio Deus fosse lidar com Satanás, seria muito fácil; num momento, Satanás cairia. Mas Deus não faria isso por Si mesmo. Ele queria que um homem lidasse com Satanás; Ele pretendia que a criatura lidasse com a criatura. Quando o Senhor Jesus se tornou um homem, Ele foi tentado como homem e passou por todas as experiências humanas. Hoje, tal Pessoa ascendeu ao céu e está assentada à direita de Deus. Esse homem está glorificado. Hebreus 2 nos mostra que Ele não veio para receber glória como Deus, mas como homem. Não queremos dizer com isso que Ele não teve a glória de Deus, e, sim, que Hebreus 2 não se refere à glória que Ele possuía como Deus. Foi o mesmo Jesus, que foi feito um pouco menor que os anjos pelo sofrimento da morte, que foi coroado com glória e honra. Nosso Senhor ascendeu como homem. Hoje, como homem, Ele entrou nos céus. No futuro, haverá muitos homens que entrarão lá. Hoje, um homem está assentado no trono. Um dia, haverá muitos homens assentados no trono. Isso é garantido.
Quando o Senhor Jesus ressuscitou, Ele dispensou Sua vida a nós. Quando cremos Nele, recebemos Sua vida. Todos nos tornamos filhos de Deus e assim pertencemos a Ele. É por termos essa vida em nosso interior que como homens podemos ser comissionados por Deus para cumprir Seu propósito. Por essa razão, diz-se que Ele introduzirá muitos filhos na glória. Reinar é ser glorificado e ser glorificado é reinar. Quando os muitos filhos tiverem obtido autoridade e restaurado a terra, eles serão triunfantemente introduzidos na glória.
Nunca devemos presumir que o propósito de Deus é meramente salvar-nos do inferno para desfrutar as bênçãos do céu. Devemos lembrar-nos que Deus pretende que o homem suceda Seu Filho no exercício de Sua autoridade na terra. Deus quer cumprir algo, mas não o fará por Si mesmo; Ele quer que nós o façamos. Quando o tivermos feito, Ele terá atingido Seu propósito. Deus deseja obter um grupo de homens que farão a Sua obra aqui na terra, para Ele reinar na terra por meio do homem.
(Watchman Nee - A Igreja Gloriosa - Ed. Árvore da Vida, 2a ed. - 2005, p. 23-25)

II - Em Cristo, Deus resgatou a autoridade dada ao homem e perdida em Adão:

Vamos começar com o Senhor Jesus Cristo. Vocês têm que se lembrar que Jesus veio a terra num tempo em que os Romanos estavam no poder. E os Romanos tinham certo tipo de liderança que marcou sua sociedade. Eles receberam esse modelo de liderança dos Babilônicos e dos Egípcios. Mas, os Romanos o levaram à perfeição. Este modelo era a estrutura de liderança hierárquica. No meu país, nossos militares são padronizados conforme esta estrutura. Os Romanos eram grandes guerreiros, então isto funcionou bem para eles. Você entende de hierarquia? Você tem alguém no topo, então tem alguém abaixo deste, e então alguém lá embaixo. Aquele no topo tem mais autoridade que o outro abaixo dele. A pessoa abaixo tem menor autoridade do que o que está acima dele, e assim por diante. É um modelo descendente de autoridade. É uma autoridade de cima-para-baixo. É um estilo “relacionamento de comando”. Os Romanos aperfeiçoaram esta estrutura. Ela era parte de sua cultura. Com isto em mente, ouça as palavras de Jesus Cristo. Mateus 20:25: “Vocês sabem que os governantes dos gentios mandam neles e que os seus grandes homens exercem autoridade sobre eles.” A palavra grega para “autoridade” é exousia. Irmãos, vocês podem ler o Novo Testamento do início ao fim e jamais encontrarão esta palavra exousia (autoridade) num contexto onde um crente em Cristo tem exousia (autoridade) sobre outro crente! Você nunca encontrará isto no Novo Testamento. Isto não está lá. Vamos em frente. Jesus disse, “Os governantes dos gentios (Romanos) mandam nos que estão abaixo deles, exercendo autoridade sobre eles.” A palavra grega para “exercem autoridade” é katexousiazo. Kata significa acima ou sobre. Exousiazo significa exercer autoridade sobre alguém. Então, katexousiazo significa autoridade de-cima-para-baixo. Isto se refere a liderança hierárquica. E Jesus está condenando isto! Jesus também usa a frase “mandam neles” (ou “exercem domínio sobre eles”) para descrever esta forma de liderança. A palavra Grega para “mandar” é katakurieuo. Fique com isto em mente.
De acordo com Jesus, os gentios exercem autoridade de cima para baixo. Eles estão governando as pessoas. Eles estão dominando as pessoas. Eles estão controlando as pessoas. Isto sempre acontece com estruturas hierárquicas de autoridade descendente. Isto cria uma cultura de controle e opressão. Mas, o nosso Senhor diz: “Não deve ser assim entre vocês!”. Jesus Cristo, quando veio para esta terra, foi a pessoa mais livre que já tocou este planeta. Seu trabalho principal foi libertar pessoas. Ele é o Grande Libertador. Nos seus dias, ele libertou as mulheres. As mulheres o seguiram aonde ele foi. E quando ele morreu na cruz, eram as mulheres que estavam lá e ficaram com ele. Quando ele ressurgiu dos mortos, foram as mulheres que vieram a ele primeiro. Jesus Cristo tinha uma visão muito exaltada dos seus seguidores. Ele tinha uma visão exaltada das mulheres num tempo em que elas eram oprimidas e suprimidas. Ele era um libertador. Isto é muito importante, irmãos. Existe algo no seu Senhor que é libertador, que torna as pessoas livres. Jesus diz: “Quem quiser ser grande entre vocês, os meus discípulos, deve ser servo de vocês”. Eu vou fazer uma declaração muito importante nesse ponto ao qual iremos voltar. A marca de um servo de Deus é que ele venha a libertar pessoas. Não governá-las. Não controlá-las. Mas, libertá-las. Uma das coisas mais importantes que eu faço quando planto igrejas é libertar pessoas. E este é o ministério de Jesus Cristo. Agora vamos para Mateus 28. Jesus está pronto para ascender ao céu. Estas são algumas de suas últimas palavras. Vocês estão familiarizados com elas. Mateus 28.18: “Todo poder foi me dado no céu e na terra. Toda autoridade é minha” Agora, irmãos, não existe autoridade, exceto a autoridade de Jesus Cristo! Somente Ele tem autoridade. Não há autoridade a não ser a dele. Isto é importante.
(Frank Viola - Conversa franca com pastores - disponível em www.ptmin.org - p. 7-8)

III - Deus exerce sua autoridade na igreja. Como ele a exerce? 

Por isso, também eu, tendo ouvido da fé que há entre vós no Senhor Jesus e o amor para com todos os santos, não cesso de dar graças por vós, fazendo menção de vós nas minhas orações, para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes qual é a esperança do seu chamamento, qual a riqueza da glória da sua herança nos santos e qual a suprema grandeza do seu poder para com os que cremos, segundo a eficácia da força do seu podero qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos e fazendo-o sentar à sua direita nos lugares celestiais, acima de todo principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa referir, não só no presente século, mas também no vindouro. E pôs todas as coisas debaixo dos pés, e para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igrejaa qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas.
(Ef.  1: 15-23)

A autoridade é o privilégio dado por Deus para realizar uma ação particular.  O vocábulo do NT que mais se aproxima da palavra “autoridade” éexousia.  Exousia deriva da palavra exestin, que significa uma ação possível e legítima que pode ser levada a cabo sem obstáculo.
A autoridade (exousia) relaciona-se com manifestação e comunicação de poder.  Mais especificamente, a autoridade é o direito de realizar uma ação particular. A Escritura ensina que Deus é a fonte única de toda autoridade (Rom. 13.1), e esta autoridade foi conferida a Seu Filho (Mat. 28:18; João 3:30-36; 17:2).
Apenas Jesus Cristo tem autoridade.  O Senhor Jesus disse claramente, “Toda autoridade me foi dada no céu e sobre a terra”. Ao mesmo tempo, Deus delegou Sua autoridade aos homens e mulheres deste mundo para propósitos específicos.
Por exemplo, na ordem natural, Deus instituiu diversas esferas onde Sua autoridade deve ser exercida (Efésios 5:22-6:18; Col. 3:18-25).  Estabeleceu certas “autoridades oficiais” com o propósito da preservação da ordem sob o sol.  Aos oficiais governamentais, como reis, magistrados e juízes, foi dada esta autoridade (João 19:10, 11; Rom. 13:1 ss.; 1 Tim. 2:2; 1 Ped. 2:13-14).
A autoridade oficial é autoridade conferida a um oficio estático. Funciona independente das ações da pessoa que a ocupa.  A autoridade oficial é autoridade posicional e fixa. Enquanto a pessoa ocupar o cargo, tem autoridade.
Quando alguém exerce as funções de autoridade, o recipiente chega a ser “uma autoridade” por seu próprio direito. É por esta razão que se exorta aos cristãos que se sujeitem aos líderes governamentais – não importando seu caráter (Rom. 13:1ss.; 1 Ped. 2:13-19).
Nosso Senhor Jesus, assim como Paulo, mostraram espírito de sujeição quando compareceram ante a autoridade oficial (Mat. 26:63-64; Atos 23:2-5).  De maneira similar, devemos sempre nos sujeitar a esta autoridade. A ausência de lei e o desprezo pela autoridade são sinais de uma natureza pecadora (2 Ped. 2:10; Judas 8).  Ao mesmo tempo, a sujeição e a obediência são duas coisas bem diferentes, e é um erro fatal confundi-las.


Sujeição Versus Obediência

Em que difere a sujeição da obediência?  A sujeição é uma atitude. A obediência é uma ação.  A sujeição é absoluta. A obediência é relativa.  A sujeição é incondicional. A obediência é condicional. A sujeição é um assunto interior. A obediência é um assunto exterior.
Deus nos convoca a ter um espírito de humilde sujeição diante daqueles que Ele colocou em autoridade sobre nós  na ordem natural.  Contudo, não podemos obedece-los se nos mandam fazer o que viola Sua vontade, porque a autoridade de Deus é maior que qualquer autoridade terrena.
Não obstante, você pode desobedecer enquanto se submete.  Pode desobedecer a uma autoridade terrena mantendo um espírito de humilde sujeição. Pode desobedecer e ao mesmo tempo manter uma atitude de respeito e reverencia, distinto do espírito de rebelião, injuria e subversão (1 Tim. 2:1-2; 2 Ped. 2:10; Judas 8).
A desobediência das parteiras hebréias (Exo. 1:17), os três jovens hebreus (Dan. 3:17-18), Daniel (Dan. 6:8-10), e os apóstolos (Atos 4:18-20; 5:27-29) exemplificam o principio de estar sujeito a uma autoridade oficial ao mesmo tempo em que desobedece quando esta se choca com a vontade de Deus.
Se Deus estabelece autoridade oficial para operar na ordem natural, Ele não instituiu este tipo de autoridade na igreja. É por essa razão que os líderes eclesiásticos silenciam diante dos argumentos de Paulo na esfera da autoridade em Efésios 5-6 e Colossenses 3. Deus dá autoridade (exousia) aos crentes para exercer certos direitos. Entre eles está a autoridade (exousia) de serem feitos filhos de Deus (João 1:12), possuir propriedades (Atos 5:4), decidir casar-se ou não (1 Cor. 7:37), decidir o que comer ou beber (1 Cor. 8:9), curar enfermidades (Mar. 3:15), expulsar demônios (Mat. 10:1; Mar. 6:7; Luc. 9:1; 10:19), edificar a igreja (2 Cor. 10:8; 13:10), receber bênçãos especiais associadas a certos ministérios (1 Cor. 9:4-18; 2 Tes. 3:8-9), ter autoridade sobre as nações e comer da árvore da vida no reino futuro (Ap. 2:26; 22:14).
Mas em nenhuma parte a Bíblia ensina que Deus deu autoridade (exousia) aos crentes sobre outros crentes!  Recordemos a palavra de nosso Senhor em Mateus 20:25-26 e Lucas 22:25-26 onde condena as formas de autoridade tipo exousia entre Seus seguidores.  Este fato deve ser motivo para uma séria reflexão.
Portanto, sugerir que os líderes na igreja devem exercer o mesmo tipo de autoridade que os dignitários representa  logicamente um salto e uma excessiva generalização.  Uma vez mais, o NT nunca vincula aexousia aos líderes da igreja, nem estabelece que alguns crentes tenham exousia sobre outros crentes.
Sem dúvida, o AT descreve os profetas, sacerdotes, reis e juízes, como autoridades oficiais. Isto se deve ao fato destes “ofícios” serem sombras da autoridade ministerial do próprio Jesus Cristo. Cristo é o verdadeiro Profeta, Sacerdote, Rei e Juiz. Mas no NT nunca encontramos qualquer passagem que descreva ou represente algum líder enquanto autoridade oficial. Isto inclui os guardiões locais, assim como aos obreiros de fora.
Para ser franco, a noção de que os cristãos têm autoridade sobre outros cristãos é um exemplo de exegese forçada e, como tal, é biblicamente insustentável.  Quando os líderes da igreja exercem o mesmo tipo de autoridade que desempenham os oficiais governamentais, tornam-se usurpadores!
Certamente, a autoridade funciona na igreja, mas esta autoridade que funciona na ekklesia é notavelmente diferente da que se exerce na ordem natural.  Isto faz sentido na medida em que a igreja não é uma organização humana, mas um organismo espiritual.  A autoridade que opera na igreja não é oficial.  É orgânica.

Autoridade Divina Versus Autoridade Oficial

Quê é autoridade orgânica? É a autoridade baseada na vida espiritual.  A autoridade orgânica é autoridade comunicada.  Ou seja, quando uma pessoa comunica a vida de Deus através da palavra ou obra, tem a ajuda e o respaldo do próprio Senhor.
Todos os cristãos em virtude do fato de possuírem a vida do Espírito, possuem uma medida de autoridade orgânica. É por esta razão que o NT nos ordena a que nos submetamos uns aos outros no temor de Cristo. Mas os mais maduros na vida espiritual tendem a expressar o pensamento de Deus de uma maneira mais firme que os carnais e imaturos (Heb. 5:14).
A autoridade orgânica tem sua fonte na direção imediata de Cristo e não em um ofício estático.  A autoridade orgânica não é intrínseca a uma pessoa ou a uma posição.  Não reside no próprio homem ou no cargo que ocupa (como ocorre com a autoridade oficial).
Pelo contrário, a autoridade orgânica está fora do indivíduo. Isto é assim porque esta pertence a Cristo.  Somente quando Cristo dirige a uma pessoa a palavra ou a ação é que essa pessoa exerce autoridade. Em outras palavras, uma pessoa tem direito de ser ouvida e obedecida apenas quando reflete a mente do Senhor. A autoridade orgânica, por conseguinte, é comunicada e derivada.
A natureza comunicativa da autoridade orgânica pode ser compreendida no bojo da metáfora do Corpo que Paulo traça para a igreja.  Quando a Cabeça (que é a fonte de toda autoridade) pede à mão que se mova, a mão possui a autoridade da Cabeça. A mão, não obstante, não tem autoridade própria. Sua autoridade surge apenas quando atua de acordo com a comunicação da Cabeça. A mão é uma autoridade na medida em que representa a vontade da Cabeça.
Note que o movimento da cabeça física em relação ao corpo físico é orgânico. Está baseado no humano como um organismo vivente que possui vida natural. O mesmo princípio é verdadeiro no que toca à Cabeça espiritual e ao Corpo espiritual. Os crentes exercem autoridade espiritual somente quando suas palavras e atos representam a Cristo.
Por conseguinte, a autoridade orgânica é flexível e fluída, e nunca estática.  A autoridade orgânica é transmitida e baseia-se na maturidade espiritual e no serviço.  Portanto, não é algo irrevogável.
Isto explica por que Pedro e Tiago, assim como Paulo e Barnabé, flutuavam com relação à medida da influência espiritual que exerciam (Atos 1:15; 2:14; 12:17,25; 13:2,7, 13ss.; 15:2,7,13,22). Uma vez que a autoridade divina não é oficial, mas derivada, os crentes não assumem, herdam, conferem, nem substituem a autoridade de Deus.  Unicamente a representam. Esta é uma diferença categórica. A falha em compreendê-la conduz à confusão e ao abuso no povo de Deus.
Quando discutimos a autoridade espiritual, a ênfase sempre deve estar na função e no serviço e não numa noção mística de “espiritualidade”. Exigir autoridade com base na própria espiritualidade é praticamente o mesmo que se proclamar autoridade oficial, pois reivindicar "espiritualidade" constitui um ofício velado.
Se alguém é verdadeiramente espiritual, sua espiritualidade se manifestará na forma como vive, serve e escuta o Senhor.  A espiritualidade pode discernir-se apenas a partir deste último e não pelos reclamos promocionais da pessoa que a assume.  Desta maneira, manter o enfoque no serviço e na função ajuda a proteger as igrejas que seguem o modelo do NT para que não descambem no culto à personalidade.

Uma Comparação Proveitosa

Separemos algumas das distinções entre autoridade oficial e autoridade orgânica.
As autoridades oficiais devem ser obedecidas sempre e quando o que declarem não viole a vontade de uma autoridade superior. (Atos 5:29).  O NT aconselha aos filhos que obedeçam a seus pais (Efésios 6:11; Col. 3:20), aos cidadãos que obedeçam as autoridades governamentais (Tito 3:1), e aos empregados que obedeçam a seus empregadores. (Efésios 6:5; Col. 3:22).
Por contraste, aos que exercem autoridade orgânica nunca é exigido obediência.  Antes, eles buscarão persuadir aos demais para que obedeçam a vontade de Deus.  Por esta razão, Hebreus 13:17 nos convoca a que permitamos que nossos líderes nos persuadam (peitho).

1- As cartas de Paulo lançam mais luz sobre este tema. Todas elas abundam com súplicas e petições, e estão carregadas com uma linguagem persuasiva. (Sobre isto detalharemos mais adiante).
2- As autoridades oficiais são totalmente responsáveis na medida em que conduzem a práticas errôneas aqueles que estão sob sua responsabilidade.  Em Números 18 aprendemos que o peso da iniqüidade caiu sobre os ombros dos sacerdotes. Eles eram as autoridades oficiais em Israel. Ao contrário das autoridades oficiais, a autoridade orgânica nunca anula a responsabilidade dos demais.  Na igreja, os crentes são totalmente responsáveis pelas suas próprias ações – mesmo quando decidem obedecer ao conselho de outro. É por esta razão que a Escritura repetidamente menciona a prova dos frutos. Igualmente ensina que o engano traz consigo o juízo divino (Mat. 7:15-27; 16:11-12; 24:4-5; 1 Cor. 14:29; Gál. 1:6-9;  2:4; Fil. 3:2-19; 1 Tes. 5:21; 1 Tim. 2:14; 1 João 3:4-10; 4:1-6).  O NT nunca ensina que o cristão que obedece outra pessoa não é responsável por suas ações.
3- As autoridades oficiais podem ser menos maduras, menos espirituais e menos justas do que aqueles sobre os quais tem autoridade.  Mas a autoridade orgânica está diretamente vinculada à maturidade espiritual, e não pode separar-se dela.

Sempre dizemos a nossos filhos, “obedeçam aos mais velhos” porque os mais velhos (na vida natural) tendem a ser mais maduros em seu conselho. Por esta razão, merecem nosso respeito e sujeição (1 Ped. 5:5a).  Sucede o mesmo no reino espiritual.
Os que mais se desenvolvem na vida espiritual possuem uma medida maior de autoridade orgânica. (Uma pessoa não pode exercer autoridade espiritual a menos que ela mesma esteja sob a autoridade de Deus).  Um claro sinal de grandeza e maturidade espiritual é um espírito de serviço e de mansidão.  Consideremos os seguintes textos que nos exortam a estimar os que mostram ambas características:
E agora, irmãos, eu vos peço o seguinte (sabeis que a casa de Estéfanas são as primícias da Acáia e que se consagraram ao serviço dos santos): que também VOS SUJEITEIS A ESSES TAIS, COMO TAMBÉM A TODO AQUELE QUE É COOPERADOR E OBREIRO. Alegro-me com a vinda de Estéfanas, e de Fortunato, e de Acaico; porque estes supriram o que da vossa parte faltava. Porque trouxeram refrigério ao meu espírito e ao vosso. RECONHECEI, POIS, A HOMENS COMO ESTES.  (1 Cor. 16:15-18 BA).
Recebei-o, pois, no Senhor com toda a alegria, E HONRAI SEMPRE A HOMENS COMO ESSE; VISTO QUE, POR CAUSA DA OBRA DE CRISTO, CHEGOU ELE ÀS PORTAS DA MORTE E SE DISPÔS A DAR A PRÓPRIA VIDA, PARA SUPRIR A VOSSA CARÊNCIA DE SOCORRO PARA COMIGO. (Filipenses 2:29-30).
Agora, vos rogamos, irmãos, que acateis com apreço OS QUE TRABALHAM ENTRE VÓS E OS QUE VOS PRESIDEM NO SENHOR E VOS ADMOESTAM; E QUE OS TENHAIS COM AMOR EM MÁXIMA CONSIDERAÇÃO, POR CAUSA DO TRABALHO QUE REALIZAM... (1 Tes. 5:12-13).
Os anciãos que dirigem bem DEVEM SER TIDOS COMO DIGNOS DE DOBRADA HONRA, ESPECIALMENTE OS QUE TRABALHAM ARDUAMENTE NA PALAVRA E NO ENSINO... Não admitas acusação contra um ancião a não ser que haja duas ou três testemunhas. (1 Tim. 5:17, 19).
Lembrai-vos dos vossos guias, OS QUAIS VOS PREGARAM A PALAVRA DE DEUS; E, CONSIDERANDO ATENTAMENTE A FINALIDADE DE SUA VIDA, IMITAI A SUA FÉ.  (Heb. 13:7).
Deixe-vos persuadir pelos que os dirigem, E SUBMETEI-VOS A ELES; PORQUE ELLOS VELAM POR VOSSAS ALMAS, COMO QUEM TEM DEVE PRESTAR CONTAS. Para que façam isso com alegria, e não gemendo; porque isto não aproveita a vós outros (Heb. 13:17).
Rogo igualmente aos jovens. SEDE SUBMISSOS AOS MAIS VELHOS... (1 Pedro 5:5).
O NT exorta claramente a igreja para que dê a devida importância aos que trabalham incansavelmente no serviço espiritual.  Tal estima é espontânea e instintiva.  Jamais se  deve absolutizar ou formalizar.
O critério do NT para rol dos modelos é sempre funcional, e não formal.  Embora devamos valorizar o serviço dos que dedicam suas vidas a nosso serviço, é um grave erro diferencia-los formalmente do resto da comunidade dos crentes.  (É aqui onde falha o ensino da “cobertura”!).
Com efeito, a honra que um crente recebe da igreja sempre é merecida; nunca pode ser exigida ou imposta.  Os que são verdadeiramente espirituais não exigem autoridade espiritual sobre os demais, nem se jactam de seu labor e maturidade espiritual.  De fato, as pessoas que fazem tais exigências revelam sua imaturidade.  A pessoa que declara que é “o homem de Deus ungido com força e poder para os dias de hoje” – ou elogios similares – prova uma coisa: que não tem autoridade!
Muito pelo contrário, os que recebem estima na igreja são os que tem provado serem servos dignos de confiança – não na mera retórica, mas na realidade (2 Cor. 8:22; 1 Tes. 1:5; 2 Tes. 3:10).  O reconhecimento e a confiança que o Corpo tem neles é o único sinal seguro da própria autoridade espiritual.
4- As autoridades oficiais possuem autoridade até serem removidas de seu ofício delegado. Enquanto estiverem no cargo, sua autoridade funciona, indiferente de terem tomado decisões sábias ou injustas. Por exemplo, enquanto o rei Saul se sentou no trono de Israel, reteve sua autoridade mesmo depois que o Espírito de Deus haver se afastado dele (1 Sam. 16:14;24:4-6)!
A autoridade orgânica por outro lado, opera somente quando Cristo é expresso.  Deste modo, se um crente exorta a igreja para que esta faça algo que não reflita a autoridade da Cabeça (mesmo que isso não viole uma lei prescrita por Deus), não há autoridade que o respalde.  Somente Jesus Cristo tem autoridade, e somente o que flui de Sua vida tem autoridade.
5- As autoridades oficiais sempre estão estabelecidas em forma de hierarquia.  A autoridade orgânica nunca está relacionada com a hierarquia (Mat. 20:25-28; Luc. 22:25-27).  De fato, a autoridade orgânica é sempre distorcida e abusada quando associada com a hierarquia.  Como vimos aqui, o imaginário hierárquico está ausente da Escritura, porque virtualmente sempre provoca danos ao povo de Deus.
Em suma, a autoridade orgânica não flui de cima abaixo.  Tampouco funciona de maneira hierárquica como uma cadeia de comando.  Ao mesmo tempo, a autoridade orgânica tampouco funciona de baixo para cima. Ou seja, não flui da igreja para a pessoa.  Se porventura uma igreja decide dar autoridade a uma pessoa para uma tarefa específica, tal pessoa não terá autoridade se não refletir a mente de Cristo.
A autoridade orgânica funciona de dentro para fora.  Quando Cristo conduz alguém ou uma igreja a falar ou agir, eles estão respaldados pela autoridade da Cabeça!  Esta é a única autoridade que existe no universo.  Jesus Cristo, representado pelo Espírito que mora no interior dos Seus, é o exclusivo manancial, o fundamento e a fonte de toda autoridade.  E não há cobertura sobre Sua Cabeça!
O resultado final é que os problemas de liderança na moderna igreja se derivam de uma aplicação vergonhosamente superficial das estruturas de autoridade oficial em cima das relações espirituais.  Esta aplicação errônea está baseada em uma mentalidade de autoridade estilo camisa de força. Mas é um erro atroz transplantar o modelo da autoridade oficial à assembléia cristã – ou a qualquer outra esfera de relação orgânica (como o matrimônio). (Frank Viola - Quem é tua cobertura? - Cap. 3: Autoridade e Submissão)

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